Minha primeira frase é de gratidão. Sim, gratidão a você que escolheu iniciar a leitura deste artigo. Como forma de agradecimento à sua atenção, quero muito que este conteúdo lhe seja útil de alguma forma.

Espero que você não tenha achado estranho que um autor comece um texto agradecendo a atenção do leitor. Ora! Se o artigo está sendo lido, por que perder tempo agradecendo o interesse? Alguns poderiam dizer: “Nossa! Que autor mais inseguro… comece logo com este texto, antes que eu largue você falando sozinho!”, ou ainda: “Não precisa agradecer… estou bem. Pode seguir”. São frases que me remetem àquela famosa frase que escutamos quando vamos entregar um presente para alguém: “Puxa! Não precisava!”. Voltarei a esta cena em breve.

A gratidão talvez seja uma das virtudes mais importantes na história da humanidade. A partir dela criamos condições para o florescimento das outras. Assim como uma rede precisa de nós para se sustentar, a gratidão pode ser vista como uma costura no tecido das relações. Ela cria vínculos, promove cumplicidade, inspira generosidade e reforça laços de lealdade. Inúmeros estudos apontam que a demonstração consistente de gratidão traz benefícios para a saúde e promove uma sensação de paz e plenitude.

As palavras de usamos para expressar gratidão, assim como todas e quaisquer palavras, são de natureza fragmentária. Ou seja, elas representam apenas fragmentos da realidade a que se referem. Portanto, o gesto de agradecimento é expresso em diversos idiomas, por meio desta característica fragmentária da linguagem. Gostaria de dissecar estes fragmentos da linguagem da gratidão, dividindo esta virtude em três facetas: reconhecimento, celebração e retribuição.

1. Reconhecimento:

Em alguns treinamentos de liderança, conduzo conversas e práticas de reconhecimento com os participantes por meio de um processo colaborativo através do qual construímos uma espécie de “fórmula mágica” para um reconhecimento efetivo e marcante. Nestas facilitações, é muito comum observarmos os líderes iniciando um reconhecimento com palavras de gratidão. “Obrigado pelo seu esforço…”, “Gostaria de agradecer seu empenho…” ou “Obrigado pela flexibilidade…”.

Quando pretendemos reconhecer uma outra pessoa, precisamos ser específicos com relação ao objeto do reconhecimento: uma qualidade, uma atitude, uma palavra, um movimento, uma postura, uma virtude, etc. Para identificar as qualidades admiradas, precisamos parar para pensar. Desta forma, quando agradecemos alguém verbalizando o resultado deste pensamento investigativo, manuseamos a natureza fragmentária da gratidão na sua faceta do reconhecimento. Perceba como o verbo pensar é importante aqui. O caráter multifacetado da expressão da gratidão faz com que, em alguns idiomas, o gesto de agradecer seja representado por esta faceta do reconhecimento, tendo como origem palavras que remetem ao verbo pensar. Veja alguns exemplos: Em inglês, as expressões “to thank” (agradecer) e “to think” (pensar) tem origem na mesma palavra. O mesmo ocorre com o alemão, onde “zu danken” (agradecer) origina-se a partir de “zu denken” (pensar). Em francês, a palavra “reconnaissance” significa gratidão.

E lembre-se… só podemos reconhecer algo que nos é familiar. Em outras palavras, é muito provável que você também tenha as qualidades que identifica no outro! Reconheça-as!

E quando estiver recebendo algum reconhecimento, perceba que para se perceber agraciado, precisamos considerar, pensar, ponderar e refletir sobre a intenção do autor do reconhecimento. Bom, parando para pensar agora podemos então perceber o absurdo que reside naquela expressão que escutamos quando entregamos um presente ou um reconhecimento: “Puxa! Não precisava…”. Dizer algo assim, é deixar de reconhecer o esforço do outro, é ignorar seu gesto de “se importar conosco” (ou seja, é dar pouca importância ao outro). Lembre-se disto na próxima vez que receber um presente ou uma pequena lembrança de alguém.

2. Celebração

A celebração pressupõe o ‘louvor’ do agraciado por seu benfeitor. Uma vez que eu faço o reconhecimento, o próximo passo seria então celebrá-lo ou agraciá-lo. Você se lembra da questão relativa ao caráter fragmentário e multifacetado das palavras? Pois é, pesquisando um pouco sobre a origem latina da gratidão (gratias ago), descobri algo curioso. Em espanhol, dizemos “gracias” e em italiano, “grazie” e no francês, “merci“. O termo “graça” pode comportar duas dimensões de significado:

– ‘cair na graça’, ‘obter graça’ ou ‘no favor’, (ideia usada na expressão “o jogador caiu nas graças da torcida”) e;

– ‘dom’, ‘obtenção de algo não devido’, ‘entregue gratuitamente’ (como na pergunta “qual a sua graça?“, quando queremos saber o nome da pessoa).

Portanto, podemos dizer que a celebração é uma faceta da gratidão que promove uma espécie de acolhimento, absorção e incorporação daquilo que foi apenas percebido pela etapa de reconhecimento. Com a celebração, vamos para um segundo patamar e nos preparamos para o próximo grau: a retribuição.

As palavras de usamos para expressar gratidão, assim como todas e quaisquer palavras, são de natureza fragmentária. Ou seja, elas representam apenas fragmentos da realidade a que se referem.
3. Retribuição

Para falar sobre a retribuição, vamos finalmente usar como referência a nossa querida Língua Portuguesa. O singelo e familiar “obrigado” é uma das formas mais profundas de expressar a gratidão, naquilo que esta terceira faceta sugere: o conceito de retribuição. O “obrigado” (ob-ligatus) pressupõe vínculo, passando a ideia de ‘obrigação’ e do ‘dever de retribuir’. Daí surge aquela expressão: “fico te devendo essa!“, propondo a premissa de que o “galho quebrado” cria um vínculo entre as pessoas.

A retribuição traz um caráter de reciprocidade nas relações, promovendo interações cujas demonstrações de favores mútuos ajudam a criar confiança.

Portanto, se você deseja contribuir para um ambiente de confiança, lembre-se de manifestar sua gratidão utilizando expressões que passem por estas três facetas:

Reconheça as pessoas e permita-se ser reconhecido;
Celebre todo e qualquer progresso ou êxito;
Retribua esforços e favores de forma justa e imparcial